Miscelâneas do Eu

Expressar as ideais, registrar os pensamentos, sonhos, devaneios num pequeno e simplório blog desta escritora amadora que vos fala são as formas que encontrei para registrar a existência neste mundo.

Não cabe a mim julgar certo ou errado e sim, escrever o que sinto sobre o que me cerca.

A única coisa que não abro mão é do amor pelos seres humanos e incompreensão diante da capacidade de alguns serem cruéis com sua própria espécie.

Nana Pimentel

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sexta-feira, 2 de setembro de 2016

O pé da múmia



1— Cinco luíses pelo pé da princesa Hermonthis é pouco, muito pouco, na verdade. Trata-se de um pé autêntico — disse o vendedor balançando a cabeça e girando os olhos nas órbitas. — Vamos, leve-o, e ainda lhe dou a embalagem de presente — acrescentou, enrolando-o num velho pano adamascado —; muito bonito, damasco verdadeiro, damasco das Índias, que nunca foi tingido de novo, forte, macio — murmurava passeando os dedos pelo tecido puído, com um resquício de hábito comercial que o fazia elogiar um objeto de tão pouco valor que ele mesmo o considerava digno de ser dado.
2 Ele colocou as moedas de ouro numa espécie de bolsa medieval presa à cintura, repetindo:
3 — O pé da princesa Hermonthis para servir de peso de papel!
 4 Depois, fixando em mim suas pupilas fosfóricas, disse numa voz estridente como o miado de um gato que acabou de engolir uma espinha:
 5 — O velho faraó não ficará contente, ele amava a filha, o grande homem.
 6 — O senhor fala como se fosse seu contemporâneo. Apesar de velho, o senhor não é do tempo da pirâmides do Egito — respondi-lhe rindo, da porta da loja.
7 Voltei para casa bastante satisfeito com minha aquisição. Para fazer bom uso dela imediatamente, coloquei o pé da divina princesa Hermonthis sobre uma pilha de papéis. Eram esboços de versos e um mosaico indecifrável de rasuras: artigos começados, cartas esquecidas e engavetadas, algo que acontece com frequência com os distraídos. O efeito era encantador, bizarro e romântico.
8 Satisfeitíssimo com aquele embelezamento, desci para a rua e fui passear com a gravidade apropriada e o orgulho de um homem que tem, sobre todas as pessoas por quem passa, a extraordinária vantagem de possuir um pedaço da princesa Hermonthis, filha do faraó. Téophile Gauthier. In Hélène Montardre.
Medo: Histórias de terror. Trad. Júlia da Rosa Simões. São Paulo: Companhia das Letras, 2013, p. 13. 1

1) O clima de mistério do conto, já instaurado pela estranheza do produto vendido na loja de antiguidades, é acentuado por alguns índices sutilmente distribuídos ao longo dessa estranha negociação. Indique três desses índices e levante hipóteses sobre o significado deles.
2) Qual é o foco narrativo do conto? Como a escolha desse foco narrativo pôde contribuir para a instauração do mistério?


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